2012/05/09

Declaração Schuman - 09/05/1950



«A paz mundial não poderá ser salvaguardada sem esforços criadores à medida dos perigos que a ameaçam. A contribuição que uma Europa organizada e viva pode dar à civilização é indispensável para a manutenção de relações pacíficas. A França, ao assumir -se desde há mais de 20 anos como defensora de uma Europa unida, teve sempre por objetivo essencial servir a paz. A Europa não foi construída, tivemos a guerra.
A Europa não se fará de um golpe, nem numa construção de conjunto: far-se-á por meio de realizações concretas que criem em primeiro lugar uma solidariedade de facto. A união das nações europeias exige que seja eliminada a secular oposição entre a França e a Alemanha. Com esse objetivo, o Governo francês propõe atuar imediatamente num plano limitado mas decisivo.
O Governo francês propõe subordinar o conjunto da produção franco-alemã de carvão e de aço a uma Alta Autoridade, numa organização aberta à participação dos outros países da Europa.  A comunitarização das produções de carvão e de aço assegura imediatamente o estabelecimento de bases comuns de desenvolvimento económico, primeira etapa da federação europeia, e mudará o destino das regiões durante muito tempo condenadas ao fabrico de armas de guerra, das quais constituíram as mais constantes vítimas.
A solidariedade de produção assim alcançada revelará que qualquer guerra entre a França e a Alemanha se tornará não apenas impensável como também materialmente impossível. O estabelecimento desta poderosa unidade de produção aberta a todos os países que nela queiram participar, que permitirá o fornecimento a todos os países que a compõem dos elementos fundamentais da produção industrial em idênticas condições, lançará os fundamentos reais da sua unificação económica.
Esta produção será oferecida a todos os países do mundo sem distinção nem exclusão, a fim de participar na melhoria do nível de vida e no desenvolvimento das obras de paz. Com meios acrescidos, a Europa poderá prosseguir a realização de uma das suas funções essenciais: o desenvolvimento do continente africano. Assim se realizará, simples e rapidamente, a fusão de interesses indispensável à criação de uma comunidade económica e introduzirá o fermento de uma comunidade mais vasta e mais profunda entre países durante muito tempo opostos por divisões sangrentas.
Esta proposta, por intermédio da comunitarização de produções de base e da instituição de uma nova Alta Autoridade cujas decisões vincularão a França, a Alemanha e os países aderentes, realizará as primeiras bases concretas de uma federação europeia indispensável à preservação da paz. O Governo francês, a fim de prosseguir a realização dos objetivos assim definidos, está disposto a iniciar negociações nas seguintes bases.
A missão atribuída à Alta Autoridade comum consistirá em, nos mais breves prazos, assegurar: a modernização da produção e a melhoria da sua qualidade; o fornecimento nos mercados francês, alemão e nos países aderentes de carvão e de aço em condições idênticas; o desenvolvimento da exportação comum para outros países; a harmonização no progresso das condições de vida da mão-de-obra dessas indústrias.
Para atingir estes objetivos a partir das condições muito diversas em que se encontram atualmente as produções dos países aderentes, deverão ser postas em prática, a titulo provisório, determinadas disposições, incluindo a aplicação de um plano de produção e de investimentos, a instituição de mecanismos de perequação dos preços e a criação de um fundo de reconversão destinado a facilitar a racionalização da produção. A circulação do carvão e do aço entre países aderentes será imediatamente isenta de qualquer direito aduaneiro e não poderá ser afetada por tarifas de transportes distintas. Criar-se-ão progressivamente as condições para assegurar espontaneamente a repartição mais racional da produção ao nível de produtividade mais elevada.
Ao contrário de um cartel internacional que tende a repartir e a explorar os mercados nacionais com base em práticas restritivas e na manutenção de elevados lucros, a organização projetada assegurará a fusão dos mercados e a expansão da produção.
Os princípios e os compromissos essenciais acima definidos serão objeto de um tratado assinado entre os estados. As negociações indispensáveis a fim de precisar as medidas de aplicação serão realizadas com a assistência de um mediador designado por comum acordo; este terá a missão de velar para que os acordos sejam conformes com os princípios e, em caso de oposição irredutível, fixará a solução a adotar.
A Alta Autoridade comum, responsável pelo funcionamento de todo o regime, será composta por personalidades independentes e designada numa base paritária pelos governos; será escolhido um presidente por comum acordo entre os governos; as suas decisões serão de execução obrigatória em França, na Alemanha e nos restantes países aderentes. As necessárias vias de recurso contra as decisões da Alta Autoridade serão asseguradas por disposições adequadas. Será elaborado semestralmente por um representante das Nações Unidas junto da referida Alta Autoridade um relatório público destinado à ONU e dando conta do funcionamento do novo organismo, nomeadamente no que diz respeito à salvaguarda dos seus fins pacíficos.
A instituição de Alta Autoridade em nada prejudica o regime de propriedade das empresas. No exercício da sua função, a Alta Autoridade comum terá em conta os poderes conferidos à autoridade internacional da região do Rur e as obrigações de qualquer natureza impostas à Alemanha, enquanto estas subsistirem.»


Déclaration Schuman - 09/05/1950


«La paix mondiale ne saurait être sauvegardée sans des efforts créateurs à la mesure des dangers qui la menacent. La contribution qu'une Europe organisée et vivante peut apporter à la civilisation est indispensable au maintien des relations pacifiques. En se faisant depuis plus de vingt ans le champion d'une Europe unie, la France a toujours eu pour objet essentiel de servir la paix. L'Europe n'a pas été faite, nous avons eu la guerre.
L'Europe ne se fera pas d'un coup, ni dans une construction d'ensemble : elle se fera par des réalisations concrètes créant d'abord une solidarité de fait. Le rassemblement des nations européennes exige que l'opposition séculaire de la France et de l'Allemagne soit éliminée. L'action entreprise doit toucher au premier chef la France et l'Allemagne. Dans ce but, le gouvernement français propose immédiatement l'action sur un point limité mais décisif.
Le gouvernement français propose de placer l'ensemble de la production franco-allemande de charbon et d'acier sous une Haute Autorité commune, dans une organisation ouverte à la participation des autres pays d'Europe.  La mise en commun des productions de charbon et d'acier assurera immédiatement l'établissement de bases communes de développement économique, première étape de la Fédération européenne, et changera le destin de ces régions longtemps vouées à la fabrication des armes de guerre dont elles ont été les plus constantes victimes.
La solidarité de production qui sera ainsi nouée manifestera que toute guerre entre la France et l'Allemagne devient non seulement impensable, mais matériellement impossible. L'établissement de cette unité puissante de production ouverte à tous les pays qui voudront y participer, aboutissant à fournir à tous les pays qu'elle rassemblera les éléments fondamentaux de la production industrielle aux mêmes conditions, jettera les fondements réels de leur unification économique.
Cette production sera offerte à l'ensemble du monde sans distinction ni exclusion, pour contribuer au relèvement du niveau de vie et au développement des œuvres de paix. L'Europe pourra, avec des moyens accrus, poursuivre la réalisation de l'une de ses tâches essentielles: le développement du continent africain.
Ainsi sera réalisée simplement et rapidement la fusion d'intérêts indispensable à l'établissement d'une communauté économique qui introduit le ferment d'une communauté plus large et plus profonde entre des pays longtemps opposés par des divisions sanglantes.
Par la mise en commun de productions de base et l'institution d'une Haute Autorité nouvelle, dont les décisions lieront la France, l'Allemagne et les pays qui y adhéreront, cette proposition réalisera les premières assises concrètes d'une Fédération européenne indispensable à la préservation de la paix.
Pour poursuivre la réalisation des objectifs ainsi définis, le gouvernement français est prêt à ouvrir des négociations sur les bases suivantes.
La mission impartie à la Haute Autorité commune sera d'assurer dans les délais les plus rapides: la modernisation de la production et l'amélioration de sa qualité, la fourniture à des conditions identiques du charbon et de l'acier sur le marché français et sur le marché allemand, ainsi que sur ceux des pays adhérents, le développement de l'exportation commune vers les autres pays, l'égalisation dans le progrès des conditions de vie de la main-d’œuvre de ces industries.
Pour atteindre ces objectifs à partir des conditions très disparates dans lesquelles sont placées actuellement les productions des pays adhérents, à titre transitoire, certaines dispositions devront être mises en œuvre, comportant l'application d'un plan de production et d'investissements, l'institution de mécanismes de péréquation des prix, la création d'un fonds de reconversion facilitant la rationalisation de la production. La circulation du charbon et de l'acier entre les pays adhérents sera immédiatement affranchie de tout droit de douane et ne pourra être affectée par des tarifs de transport différentiels. Progressivement se dégageront les conditions assurant spontanément la répartition la plus rationnelle de la production au niveau de productivité le plus élevé.
A l'opposé d'un cartel international tendant à la répartition et à l'exploitation des marchés nationaux par des pratiques restrictives et le maintien de profits élevés, l'organisation projetée assurera la fusion des marchés et l'expansion de la production.
Les principes et les engagements essentiels ci-dessus définis feront l'objet d'un traité signé entre les Etats et soumis à la ratification des parlements. Les négociations indispensables pour préciser les mesures d'application seront poursuivies avec l'assistance d'un arbitre désigné d'un commun accord; celui-ci aura charge de veiller à ce que les accords soient conformes aux principes et, en cas d'opposition irréductible, fixera la solution qui sera adoptée.
La Haute Autorité commune chargée du fonctionnement de tout le régime sera composée de personnalités indépendantes désignées sur une base paritaire par les gouvernements; un président sera choisi d'un commun accord par les gouvernements; ses décisions seront exécutoires en France, en Allemagne et dans les autres pays adhérents. Des dispositions appropriées assureront les voies de recours nécessaires contre les décisions de la Haute Autorité. Un représentant des Nations Unies auprès de cette autorité sera chargé de faire deux fois par an un rapport public à l'ONU, rendant compte du fonctionnement de l'organisme nouveau, notamment en ce qui concerne la sauvegarde de ses fins pacifiques.
L'institution de la Haute Autorité ne préjuge en rien du régime de propriété des entreprises. Dans l'exercice de sa mission, la Haute Autorité commune tiendra compte des pouvoirs conférés à l'Autorité internationale de la Ruhr et des obligations de toute nature imposées à l'Allemagne, tant que celles-ci subsisteront.»


2012/04/09

Günter Grass

"O que há a dizer"

Porque guardo silêncio, há demasiado tempo,
sobre o que é manifesto
e se utilizava em jogos de guerra
em que no fim, nós sobreviventes,
acabamos como meras notas de rodapé.

É o suposto direito a um ataque preventivo,
que poderá exterminar o povo iraniano,
conduzido ao júbilo
e organizado por um fanfarrão,
porque na sua jurisdição se suspeita
do fabrico de uma bomba atómica.

Mas por que me proibiram de falar
sobre esse outro país [Israel] onde há anos
– ainda que mantido em segredo –
se dispõe de um crescente potencial nuclear,
que não está sujeito a qualquer controlo,
já que é inacessível a qualquer inspecção?

O silêncio geral sobre esse facto,
a que se sujeitou o meu próprio silêncio,
sinto-o como uma gravosa mentira
e coacção que ameaça castigar
quando não é respeitada:
“anti-semitismo” se chama a condenação.

Agora, contudo, porque o meu país,
acusado uma e outra vez, rotineiramente,
de crimes muito próprios,
sem quaisquer precedentes,
vai entregar a Israel outro submarino
cuja especialidade é dirigir ogivas aniquiladoras
para onde não ficou provada
a existência de uma única bomba,
se bem que se queira instituir o medo como prova… digo o que há a dizer.

Por que me calei até agora?
Porque acreditava que a minha origem,
marcada por um estigma inapagável,
me impedia de atribuir esse facto, como evidente,
ao país de Israel, ao qual estou unido
e quero continuar a estar.

Por que motivo só agora digo,
já velho e com a minha última tinta,
que Israel, potência nuclear, coloca em perigo
uma paz mundial já de si frágil?

Porque há que dizer
o que amanhã poderá ser demasiado tarde,
e porque – já suficientemente incriminados como alemães –
poderíamos ser cúmplices de um crime
que é previsível,
pelo que a nossa quota-parte de culpa
não poderia extinguir-se
com nenhuma das desculpas habituais.

Admito-o: não vou continuar a calar-me
porque estou farto
da hipocrisia do Ocidente;
é de esperar, além disso,
que muitos se libertem do silêncio,
exijam ao causante desse perigo visível
que renuncie ao uso da força
e insistam também para que os governos
de ambos os países permitam
o controlo permanente e sem entraves,
por parte de uma instância internacional,
do potencial nuclear israelense
e das instalações nucleares iranianas.

Só assim poderemos ajudar todos,
israelenses e palestinos,
mas também todos os seres humanos
que nessa região ocupada pela demência
vivem em conflito lado a lado,
odiando-se mutuamente,
e decididamente ajudar-nos também.

http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=549339

2012/04/08

Günter Grass

"Ce qui doit être dit"

Pourquoi me
taire, pourquoi 
taire trop longtemps
Ce qui est manifeste, ce à quoi l'on s'est exercé
dans des 
jeux de stratégie au terme desquels
nous autres survivants sommes tout au plus
des notes de pas de pages

C'est le droit affirmé à la première frappe
susceptible d'
effacer un peuple iranien
soumis au joug d'une grande gueule
qui le guide vers la liesse organisée,
sous prétexte qu'on le soupçonne, dans sa zone de 
pouvoir,
de 
construire une bombe atomique.

Mais pourquoi est-ce que je m'interdis
De désigner par son nom cet autre pays
Dans lequel depuis des années, même si c'est en secret,
On dispose d'un potentiel 
nucléaire en expansion
Mais sans contrôle, parce qu'inaccessible
À toute vérification?

Le silence général sur cet état de fait
silence auquel s'est soumis mon propre silence,
pèse sur moi comme un mensonge
une contrainte qui s'exerce sous peine de sanction
en cas de transgression ;
le verdict d'"antisémitisme" est courant.

Mais à présent, parce que de mon pays,
régulièrement rattrapé par des crimes
qui lui sont propres, sans pareils,
et pour lesquels on lui demande des comptes,
de ce pays-là, une fois de plus, selon la pure règle des affaires,
quoiqu'en le présentant habilement comme une réparation,
de ce pays, disais-je, Israël

attend la livraison d'un autre sous-marin
dont la spécialité est de 
pouvoir orienter des têtes explosives
capables de tout réduire à néant
en direction d'un lieu où l'on n'a pu 
prouver l'existence
ne fût-ce que d'une seule bombe atomique,
mais où la seule crainte veut 
avoir force de preuve,
je dis ce qui doit être dit.

Mais pourquoi me suis-je tu jusqu'ici ?
parce que je pensais que mon origine,
entachée d'une tare à tout jamais ineffaçable,
m'interdit de 
suspecter de ce fait, comme d'une vérité avérée,
le pays d'
Israël, auquel je suis lié
et veux 
rester lié.

Pourquoi ai-je attendu ce jour pour le dire,
vieilli, et de ma dernière encre :
La puissance atomique d'
Israël menace
une paix du monde déjà fragile ?
parce qu'il faut 
dire,
ce qui, dit demain, pourrait déjà l'être trop tard :
et aussi parce que nous - Allemands,
qui en avons bien assez comme cela sur la conscience -
pourrions 
fournir l'arme d'un crime prévisible,
raison pour laquelle aucun
des subterfuges habituels
n'effacerait notre complicité.

Et admettons-le : je ne me tais plus,
parce que je suis las
de l'hypocrisie de l'Occident ; il faut en outre espérer
que beaucoup puissent se libérer du silence,
et 
inviter aussi celui qui fait peser cette menace flagrante
à 
renoncer à la violence
qu'ils réclament pareillement
un contrôle
permanent et sans entraves
du potentiel nucléaire israélien
et des installations nucléaires iraniennes
exercé par une instance internationale
et accepté par les gouvernements des deux pays.

C'est la seule manière dont nous puissions les aider
tous, Israéliens, Palestiniens
plus encore, tous ceux qui, dans cette
région occupée par le délire
vivent côte à côte en ennemis
Et puis aussi, au bout du compte, nous 
aider nous-mêmes.

Traduit de l'allemand par Olivier Mannoni
http://www.lemonde.fr/idees/article/2012/04/05/ce-qui-doit-etre-dit_1681408_3232.html

2012/02/23

José Afonso (02/08/1929 - 23/02/1987)

       A falta que fazes ao espírito deste mundo, a falta que fazes ao nosso povo, a falta que fazes 25 anos depois de teres partido. Continuas vivo em cada um de nós, dentro de cada amante e defensor da justiça, da liberdade e da fraternidade humana. Serás para sempre único e insubstituível, Zeca...



      Ton absence fait défaut à l'esprit de ce monde, elle fait défaut à notre peuple, elle fait défaut depuis 25 ans que tu es parti. Mais tu es toujours bien vivant en chacun de nous, en chaque amant et défenseur de la justice, de la liberté et la fraternité humaine. Pour toujours unique et irremplaçable, Zeca...


José Afonso - Enquanto há força

José Afonso - Canção do desterro


Zeca na escadaria da Sé Velha (de pé, segundo a contar da esquerda), antes da Serenata Monumental de 1952.

2012/02/08

Jamor, 1969

        A Briosa no Jamor, 43 anos depois! É tempo de recordar essa mítica final na história da Associação Académica de Coimbra; muito mais que um simples jogo de futebol, um momento decisivo na Crise Académica de 1969. Momentos de grande coragem, momentos de contestação, de oposição ao regime e à opressão por ele organizada...


Final da Taça de Portugal, Sport Lisboa e Benfica - Associação Académica de Coimbra,
Estádio Nacional (Lisboa), 22 de Junho de 1969.

Associação Académica de Coimbra, 1969.

A contestação ao regime em pleno Estádio Nacional; a Crise Académica de 1969.

A contestação estudantil na actual Praça D. Dinis, dias antes da grande final.

Um excerto do documentário "Futebol de Causas"; a final de 1969 e a Crise Académica...