Jafar Panahi (Fora de jogo, Urso de prata, Festival de Berlim, 2006)
Desde os primórdios das civilizações, a arte é um meio muito eficaz de denunciação, de crítica, de promoção, de elogio ou ainda de simples representação do mundo. O cinema, desde a sua aparição nos finais do século XIX, ocupa um lugar de destaque no papel de sentinela atenta às deambulações da História, aos sobressaltos da actualidade. Desde La sortie de l’usine Lumière à Lyon, passando por A guerra do fogo, Kagemusha, M o vampiro de Dusseldorf, Spartacus, La dolce vita, Berlin Alexanderplatz, As vinhas da ira, Full metal jacket, ou ainda até ao recente Valsa com Bachir, o cinema torna-se denunciador das injustiças, da tirania dos homens ou das múltiplas realidades sociais. O cinema incomoda também, as polémicas são numerosas e recorrentes. Eu vos saudo, Maria, A última tentação de Cristo, Salò ou os 120 dias de Sodoma são alguns dos filmes que suscitaram um intenso debate de ideias, a censura também, e por vezes até a violência. As ideologias políticas foram frequentemente o alvo do trabalho do cineasta, gerando vivos e por vezes apaixonados debates. Eisenstein, Pasolini ou ainda Visconti, ligados às ideologias comunistas, abordaram a luta do proletariado, as injustiças sociais ou a revolução social com muita pertinência. Se o debate é frequente quando são abordados as temáticas políticas, sociais ou religiosas, as restrições eventualmente reivindicadas por tendências mais extremas do Ocidente não se podem comparar às práticas de outras sociedades muito menos tolerantes. O cineasta iraniano Jafar Panahi acaba de ser condenado a 6 anos de prisão e 20 anos de interdição de realizar filmes, de conceder entrevistas assim como sair do seu país. O apoio dado à candidatura oposicionista de Moussavi, durante as últimas eleições presidenciais de 2009, está na origem do seu aprisionamento em Março deste ano. Durante a sua estadia nos cárceres iranianos, a qual coincide com o Festival de Cannes onde iria integrar o júri, Jafar Panahi inicia uma greve da fome como forma de protesto contra os maus-tratos de que é alvo na prisão. Da filmografia de Panahi são de destacar três filmes, três filmes incómodos para os acólitos de Ahmadinejad: O círculo (2000), que aborda a condição da mulher no Irão e em particular a prostituição ; Ouro e carmim (2003), que relata as dificuldades vividas por um veterano da guerra Irão-Iraque; Fora de jogo (2006), oferecendo novamente uma perspectiva sobre o lugar da mulher na sociedade iraniana, aqui, através de jovens mulheres adeptas de futebol mas a quem está proibida a entrada nos estádios. A recente história de Jafar Panahi não é inovadora no que se refere às relações entre o poder e a arte. O poder político mostrou-se sempre muito atento às manifestações artísticas, seja no âmbito de um regime totalitário, seja numa democracia…
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